quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Teatro dos Sentidos

Uma experiência inesquecível... Hoje, por força desses encontros mágicos do destino, conheci o Teatro dos Sentidos, e assisti à peça encenada por eles: Feliz Ano Novo. Nem sei se posso dizer que “assisti”, talvez eu possa dizer, assim como todos da plateia, que participei da peça Feliz Ano Novo. É isso mesmo, o grupo teatral do Rio de Janeiro Teatro dos Sentidos, dirigido pela atriz e escritora Paula Wenke, desenvolveu um trabalho voltado especialmente para a tchurma do apagão, mas quem enxerga é igualmente bem vindo na plateia e, com uma venda nos olhos, tem a oportunidade de mergulhar no espetáculo da mesma forma que nós, deleitando-se com todos os outros sentidos fora a visão. Sim, todos mesmo! E as surpresas que tive com meus outros sentidos sendo provocados foi um dos pontos fortes da minha imensa emoção. Primeiro me surpreendi ao sentir os aromas de elementos presentes na narrativa. Logo depois, qual não foi minha surpresa quando os personagens compartilharam com a plateia comidas que compunham a cena, como biscoitos de chocolate, pipoca salgadinha (e eu sonhei pelo resto da peça com aquela bacia de pipoca passando de novo pela minha mão... ), e até champanhe para comemorar com eles a virada do ano. No carnaval da história, confetes e cerpentinas eram jogados abundantemente sobre nós, como uma chuvinha gostosa de alegria e surpresa. Sons dos mais variados tipos, produzidos pelos atores bem próximo da plateia, assustavam, emocionavam, faziam rir, criavam ansiedade, acariciavam, e sobretudo nos levavam para dentro das cenas. Esses sons e mais duas narradoras complementavam nosso imaginário com todas as informações necessárias para a total compreensão da trama, como uma espécie de audiodescrição, bem interativa e particular. Claro que a música também marcou presença, desde o começo, mas de repente um violino tocado ao vivo chegou surpreendendo e rasgando a emoção. Situações divertidas, comoventes, românticas, lúdicas e até de extrema tensão, como o naufrágio de um navio, foram vividas por todos nós.

Os textos e poemas de Paula, junto à brilhante atuação de todos os atores, inclusive mirins, conduziam com encanto aquela experiência inédita e inesquecível. Depois de comer, beber, rir e chorar (bastante...), ser convidada a acariciar o rosto de um personagem, sentir brisa, sereno, interagir com os bichos de uma fazenda, participar de um naufrágio, de um carnaval, de um reveillon, ouvir de perto o canto dos atores, recebi uma rosa, de verdade e sem espinhos. Despetalei-a inteira, enquanto transbordava de mim tudo aquilo intimamente mexido e tocado por aqueles carinhos que chegaram na alma através dos sentidos. As pétalas se soltavam entre meus dedos uma a uma à medida que se desenrolava o fim da peça, aquele auge de bagunça gostosa nas lembranças mais profundas, conscientes e inconscientes, quando todos os sons, todos os cheiros, todas as texturas já experimentadas durante o espetáculo, agora nos provocavam todos de uma vez, passeando entre a plateia, passando bem perto, afastando-se, como num sonho louco, como num momento especial da vida em que se repassa na mente as vivências mais marcantes. Depois de tanta emoção, derramei minhas pétalas sobre a Paula, foi minha homenagem e meu agradecimento.

Tudo isso aconteceu esta tarde na Ilha d´água, num evento interno da Petrobrás, em que participei cantando. Ao deixarmos a ilha, numa grande lancha, fomos todos juntos: eu, o violonista que me acompanhou, meu querido amigo Júlio Ribeiro, funcionários da empresa e todo o elenco da peça. Quando eu entrava na embarcação, uma vozinha gentil e acolhedora me ofereceu ajuda antes de qualquer outra; o dono da voz pegou-me pela mão e me orientou para sentar ali, num lugar vago ao seu lado. Na confusão do momento agitado, nem pude reconhecer a voz e nem perceber o tamanho daquela mãozinha, só depois que me acomodei no banquinho foi que descobri que quem estava ao meu lado e me ajudara com tanta naturalidade era o ator mais jovem do elenco, Yorran, de 10 anos de idade. Batemos um papão, e mais lindo que ouvi-lo falando sobre o público alvo daquele espetáculo, as pessoas com deficiência visual, falando sobre inclusão, foi ver e confirmar mais uma vez que projetos como este deixam suas marcas em quem assiste, em quem atua, em quem promove, em tantos quantos estiverem envolvidos. No desembarque, Yorran foi quem de novo fez questão de me ajudar e me guiar até a terra firme. No caminho mostrei a ele que o perfume da rosa ficara em minha mão, e continua até agora. Que o perfume da sensibilidade, da inclusão, das grandes ideias, fique nas mãos, na alma, na vida de todos , e que o Teatro dos Sentidos possa deixar seu rastro bom nos caminhos de cada vez mais plateias!

Feliz Ano Novo está em cartaz na Caixa Cultural, no Rio de Janeiro até o próximo domingo, dia 28. Já é a segunda temporada do grupo na Caixa; a primeira fez tanto sucesso que foi preciso repetir a dose. Divulgue, convide seus amigos e confira! Na verdade a maior parte do público que tem comparecido não tem deficiência visual, e todos saem maravilhados com a experiência multi sensorial.


Paula Wenke e atores do Teatro dos Sentidos
Teatro dos Sentidos - Feliz Ano Novo
Local: CAIXA Cultural Rio de Janeiro
Av. Almirante Barroso, 25 - Centro
Tel.: (21) 2544-4080
Data: 23 a 28 de novembro de 2010
Horário: 19h30
Valor: R$15 (inteira) e R$7,50 (meia)
Capacidade: 150 lugares mais 4 para cadeirantes
Acesso para portadores de necessidades especiais
Classificação etária: 12 anos

3 comentários:

  1. Querida Sara,
    Vc com certeza foi um grande presente dos deuses do teatro, pois sua sensibilidade artistica nos uniu, vc estava já na ilha , trabalhando e eis que no mesmo dia tem um espetáculo mágico, onde a viagem são os sentidos estimulados.
    Obrigada de coração pelas suas doces e verdadeiras palavras sentidas.
    Com certeza ,eu, vc, os artistas, somos abençoados em podermos compartilhar nossa arte e sensibilizar o mundo.
    Desejo à vc, grande sucesso na sua arte!
    Um beijo e um forte abraço!
    Alice
    ; )
    Namastê

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  2. Querida Sara: esse foi um dos dias mais marcantes. Tê-la na platéia foi uma emoção enorme. Em muitos momentos, permiti-me "assisti-la" numa profusão de expressões de júbilo que só me fazia acreditar, ainda mais, nesse trabalho. Muito obrigado pelo carinho. Vida longa ao TEATRO DOS SENTIDOS e que você, ainda, nos dê muitas alegrias!!!

    Ass: Igo Ribeiro (comandante e Elvis)

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  3. Sara querida...foi uma luta ficar em cartaz no período exato da guerra. Mas acho que forças maiores queriam que estivéssemos em campo batalhando pelo amor, arte e inclusão. Já reli inúmeras vezes seu depoimento. Não ha uma vez sequer que eu não me enterneça, que não mareje com toda a sua emoção. Você nos devolveu mais do que imagina com suas palavras que tanto nos incentivam. Obrigada por sua delicadeza e sensibilidade. De hoje em diante saiba que você é nossa madrinha afetiva. E será sempre lembrada...Um dia você estará fazendo o Teatro dos Sentidos conosco se você quiser. Beijo na alma, minha doce querida.

    Paula Wenke
    Criadora do Teatro dos Sentidos, autora de Feliz Ano Novo, diretora e atriz: Dama do Mar.

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